terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

DIREITO TRIBUTÁRIO

1. INTRODUÇÃO

O Direito Tributário é ciência que estuda os princípios e normas que disciplinam a ação estatal de exigir tributos, preocupando-se com as relações jurídicas que, em decorrência da tributação, se estabelecem entre o fisco e os contribuintes.

Na doutrina de Hugo de Brito Machado, verifica-se que é “o ramo do Direito que se ocupa das relações entre o fisco e as pessoas sujeitas às imposições tributárias de qualquer espécie, limitando o poder de tributar e protegendo o cidadão contra os abusos desse poder”. No exercício do poder de tributar, ao exigir dos indivíduos o pagamento de tributos, o Estado revela sua soberania. Entretanto, não obstante exercer a soberania, a relação que se desenvolve entre Estado e contribuinte não é relação de poder, e sim relação jurídica, devendo ser entendida como a contribuição prestada pelo indivíduo em benefício dos demais, visando ao desenvolvimento estatal. A afirmação de que é jurídica a relação estabelecida entre fisco e contribuinte justifica-se pois é necessário o respeito a normas e, também, a uma série de princípios jurídicos, dentre os quais destacam-se os seguintes:

legalidade;

anterioridade;

igualdade;

capacidade contributiva;

vedação de confisco.

Ainda, das normas que devem ser respeitadas na relação entre fisco e contribuinte, é que cuida o Direito Tributário, delimitando o poder de tributar e evitando seu exercício abusivo.

Por ser um poder, o exercício da tributação depende da existência de competência. Competência tributária é instituída e distribuída pela Carta Magna aos entes políticos que possuem capacidade legislativa, seu pressuposto. Assim, a Constituição Federal de 1988, em seus artigos 153 a 156, atribui a competência tributária às pessoas políticas abaixo arroladas:

União;

Estados-membros;

Municípios; e

Distrito Federal.

É de se ressaltar que, anteriormente, o Distrito Federal era considerado autarquia administrativa da União, e foi erigido à categoria de pessoa política à partir da Constituição de 1988.

O tributo é instituto jurídico especial, pois, sozinho, alcança os direitos fundamentais de liberdade e propriedade. O primeiro é atingido pois não é dado ao contribuinte escolher se deseja ou não fazer tal pagamento. O contribuinte não tem liberdade de escolha, há imposição do tributo (obrigação ex lege); já o segundo direito fundamental é alcançado, pois o pagamento do tributo causa uma diminuição patrimonial, uma vez que atinge o patrimônio do contribuinte, assim considerado em seu aspecto material.

2. TRIBUTO

2.1. Conceito

A Constituição Federal não traz em seu texto a definição de tributo, mas cuida de uma série de figuras que com ele se assemelham, em decorrência de seu caráter coativo, impositivo. Dentre elas

a desapropriação;

o perdimento de bens;

a pena privativa de liberdade;

a pena de multa etc.

A definição doutrinária de tributo é “relação jurídica que se estabelece entre o fisco e o contribuinte, tendo por base a lei, em moeda igualitária e decorrente de um fato lícito qualquer”.

No artigo 3.º do Código Tributário Nacional está contida a definição de tributo.

Há doutrinadores que criticam o Código Tributário Nacional por tal definição, já que não é dado à lei definir, conceituar, doutrinar. Para aqueles, quem deve fazer doutrina são os estudiosos e não o legislador. No entanto, Hugo de Brito Machado afirma a necessidade da lei estabelecer conceitos em razão de controvérsias, assim como legalmente determinado é o conceito de tributo. Afirma ainda que “realmente não é bom que a lei defina, mas a definição do art. 3.º do Código Tributário Nacional é de boa qualidade”. Ainda, de acordo com o entendimento do jurista, havendo um conceito legal de tributo, torna-se incabível qualquer outro conceito proposto pela doutrina, a qual deverá apenas examinar seus elementos.

O conceito de tributo, conforme dito, está previsto no artigo 3.º do Código Tributário Nacional, abaixo transcrito:

“Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”

Conclui-se, a partir da definição supra, que tributo é uma obrigação ex lege (decorrente de lei), em moeda, que não se constitui em sanção por ato ilícito e que tem por sujeito ativo (credor), normalmente, uma pessoa política e por sujeito passivo (devedor) qualquer pessoa (apontada na lei da entidade tributante), cobrada mediante atividade administrativa vinculada.

É de se ressaltar que, não obstante ter como função principal a geração de recursos financeiros para o Estado, o tributo funciona também para interferir no domínio econômico, a fim de gerar estabilidade. Assim, é dito que o tributo tem função híbrida. A primeira é denominada função fiscal, enquanto a segunda tem a denominação de função extrafiscal.

2.2. Obrigação ex lege

Obrigação é o vínculo abstrato, de conteúdo patrimonial, pelo qual uma pessoa (sujeito passivo) vê-se compelida a dar, a fazer, a não fazer ou a suportar algo em favor de outra (sujeito ativo).

O tributo é uma obrigação ex lege, pois nasce direta e imediatamente da vontade da lei, que traça sua hipótese de incidência. As obrigações ex lege contrapõem-se às obrigações ex voluntate (em que a vontade das partes é prestigiada pelo Direito), pois o legislador, ao mencionar instituída em lei, certamente pretendeu afastar as chamadas obrigações convencionais, que teriam fulcro, invariavelmente, numa convergência de vontades. Assim, ocorrendo o fato que a lei prevê como gerador da obrigação (fato gerador in concreto ou fato imponível), obrigatório será o pagamento do tributo pelo contribuinte.

Nosso Direito desconhece o tributo in natura, no qual parte da mercadoria comercializada é entregue ao fisco a título de pagamento do tributo, como, por exemplo, a entrega de 10 quilos de arroz a cada 100 quilos vendidos, para pagamento de ICMS. Também é desconhecido por nosso ordenamento jurídico o tributo in labore, que é pago com a destinação de alguns dias de trabalho do sujeito passivo em favor do sujeito ativo, como o trabalho de profissional, durante alguns dias do mês, em favor de entidade tributante, a título de pagamento de tributo.

Assim, em decorrência de a obrigação ter origem em disposição legal, e não contratual, a capacidade tributária passiva independe da capacidade civil do contribuinte, ou do fato de, sendo uma pessoa jurídica, estar regularmente constituída, nos devidos termos do artigo 126 do Código Tributário Nacional. Assim, a título de exemplo, se menor impúbere é proprietário de imóvel, situado na cidade, não pode realizar atos de disposição do bem, entretanto, pode ser sujeito passivo de obrigação tributária, isto é, cobrança de Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU).

2.3. Obrigação em Moeda ou Cujo Valor Nela se Possa Exprimir

O tributo só pode ser pago em dinheiro corrente. Com a expressão “ou cujo valor nela se possa exprimir”, quer a lei dizer que, em circunstâncias extraordinárias, previstas em lei, é possível que o fisco aceite a satisfação da obrigação tributária com a entrega de bens, cujo valor possa ser convertido em moeda. A Lei Complementar n. 104, de 10.1.2001, acrescentou ao artigo 156 do Código Tributário Nacional o inciso XI:

“Art.156. Extinguem o crédito tributário:

...XI – a dação em pagamento em bens imóveis, na forma e condições estabelecidas em lei.”

Tal inclusão serviu para explicitar o conceito de tributo, lembrando que, em casos especiais, a lei já autorizava a extinção do crédito tributário por este instituto.

Com efeito, é de se afirmar que o tributo é prestação de caráter exclusivamente pecuniário e casos como o acima transcrito demonstram exceção à regra geral.

Mesmo o inadimplente, quando executado, cumpre sua obrigação em moeda. Isso se dá, pois os seus bens serão levados a leilão e o produto deste, a moeda, reverterá para o fisco.

2.4. O Tributo não se Constitui em Sanção por Ato Ilícito

O tributo não é penalidade decorrente da prática de ato ilícito, uma vez que o fato descrito pela lei, que gera o direito de cobrar o tributo (hipótese de incidência) será sempre algo lícito. Assim, a título de exemplo, mesmo que a origem da renda auferida seja ilícita, tal renda poderá ser tributada por meio de tributo específico (Imposto sobre a Renda em Proventos de Qualquer Natureza).

Sanção de caráter monetário é a multa, que é exigida em face da prática de uma ilicitude. A ela não importa a capacidade contributiva do agente: a prática do ilícito já é base suficiente para a cobrança da multa prevista como sanção.Já o tributo, em contrapartida, tem por pressuposto a prática de um fato lícito qualquer, que revela capacidade econômica ou contributiva.

As finalidades da multa e do tributo são diversas. Enquanto este tem finalidade primordialmente arrecadatória, aquela tem finalidade preventiva e sancionatória. Assim, enquanto o Estado tributa para atingir seus fins, a multa é instituída com o escopo de desestimular infratores.

Reafirmando, deve-se ter em conta que a lei não pode dispor, na hipótese de incidência tributária, a descrição de um fato em si mesmo ilícito, sob pena de o tributo converter-se em sanção, o que é vedado no caput do artigo 3.º do Código Tributário Nacional. Portanto, a verificação a ser feita é apenas quanto à hipótese de incidência tributária, não importando, entretanto, as origens remotas do valor tributado. O desapego às origens remotas do valor tributado é a denominada “teoria do non olet”. A expressão latina non olet significa “não cheira”, “não tem cheiro”. Afirmam os doutrinadores que a teoria mencionada surgiu em Roma, onde o Imperador Vespasiano, em face da escassez na arrecadação de tributos, instituiu imposto sobre o uso das latrinas (banheiros públicos). Tal atitude provocou grande descontentamento e revolta nos contribuintes. Dentre os críticos do imperador estava seu filho, Tito, que, perante a Corte, afirmou que não era conveniente o império romano se manter por força da arrecadação de valores originários de local tão sujo e repugnante. Nesta ocasião, Vespasiano pediu que seu filho buscasse um pouco do dinheiro arrecadado, e, já com o dinheiro nas mãos, determinou que seu filho se aproximasse e cheirasse. Feito isso, proferiu célebre frase: “Está vendo filho, não tem cheiro!”, querendo dizer que pouco importava a origem remota do valor arrecadado, se lícitas, ilícitas, morais ou imorais: basta que as origens próximas do tributo não sejam ilícitas.

Portanto, de acordo com o exemplo mencionado no início do tópico, verifica-se essa regra em relação ao imposto de renda, cuja hipótese de incidência é a obtenção de rendimento. Por força da teoria do non olet, não importa se os rendimentos obtidos originaram-se de atividade lícita. Assim, cita-se o exemplo dos bicheiros e contrabandistas que não estão eximidos do pagamento do imposto de renda.

2.5. Obrigação Cobrada Mediante Atividade Administrativa Plenamente Vinculada

A parte final do artigo 3.º do Código Tributário Nacional determina que a cobrança do tributo deverá seguir a determinação legal, não cabendo à autoridade administrativa preterir qualquer critério, quando houver expressa determinação legal.

Com efeito, não pode a autoridade optar pela cobrança ou não, quando a lei determinar que a cobrança deva ser feita. Assim, ensina Hugo de Brito Machado que ou o tributo é devido, e, nos termos que a lei determinar, deverá ser cobrado, ou não é devido e, nos termos da lei, não poderá ser cobrado.

Na Constituição Federal é possível encontrarmos noção genérica de tributo, o qual deve ser entendido como a relação jurídica que se estabelece entre o fisco e o contribuinte (pessoa abrangida pelo Direito positivo), com base na lei, em moeda, igualitária e decorrente de um fato lícito qualquer.

2.6. Critérios para Classificação dos Tributos

Diversos são os critérios relevantes de classificação dos tributos para o Sistema Tributário Nacional, conforme se verifica nos itens abaixo:

2.6.1. Quanto às espécies

Entende-se que o mais importante critério é aquele que os diferencia de acordo com suas “espécies”. No entanto, tal divisão é um pouco discutida, pois a Constituição Federal, em seu artigo 145, incisos I a III, classificou o gênero tributo em três espécies diversas, quais sejam, impostos, taxas e contribuições de melhoria, desenhando a norma-padrão de incidência de cada uma dessas figuras jurídicas e discriminando competências para que as pessoas políticas, querendo, viessem a instituí-las (sempre por meio de lei). Idêntica classificação é retirada do texto do artigo 5º do Código Tributário Nacional.

Não obstante isso, o Supremo Tribunal Federal entende que, na realidade, cinco são as espécies tributárias: impostos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições sociais e empréstimos compulsórios.

Devido à posição do Pretório Excelso, é de se aceitar a divisão do tributo em cinco espécies, tendo sido superadas as divergências passadas sobre o assunto.

Os tributos em espécie serão analisados em módulo posterior, com maiores detalhes.

2.6.2. Quanto à competência impositiva

Dividem-se de acordo com o ente tributante: federais, estaduais e municipais.

Saliente-se que o Distrito Federal acumula a competência estadual e municipal, posto que seu poder legislativo tem caráter “híbrido”.

2.6.3. Quanto à Vinculação em relação à atividade estatal

Esta classificação leva em consideração a existência ou não existência de vínculo entre o tributo cobrado e a atividade que o Estado desenvolve.

Com efeito, o tributo pode ser vinculado, quando seu fato gerador in concreto tiver relação direta com atividade desenvolvida pelo Estado. São tributos vinculados as taxas, contribuições de melhoria e contribuições sociais. A título de exemplo, tem-se o caso da taxa de água, que é cobrada em decorrência do seu fornecimento.

Já o tributo não vinculado dispensa a existência de uma atuação estatal para motivar sua cobrança. Encontra fundamento no poder de império da pessoa política tributante e presta-se, via de regra, à formação de fundos para desenvolvimento de seus fins (função fiscal do tributo). O imposto é tributo não vinculado, e exemplo típico é o imposto sobre a propriedade de veículo automotor (IPVA), cobrado do contribuinte que possua veículo, não sendo necessária qualquer contraprestação do Estado.

2.6.4. Quanto à função

Esta classificação leva em consideração a finalidade a que se destina o tributo, o objetivo por ele perseguido. Saliente-se que uma função não exclui a outra, podendo o tributo ter uma função principal e outra secundária.

De acordo com sua finalidade, pode o tributo ser classificado como fiscal, o qual objetiva a arrecadação de recursos financeiros para o ente tributante; extrafiscal, busca interferir no domínio econômico, equilibrando relações; e parafiscal, que objetiva custear entidades que atuam em áreas específicas, não alcançadas pela atividade estatal, como longa manus do Estado.

O tema parafiscalidade será tratado no módulo seguinte, junto do tema “Sujeito Ativo”, com maiores detalhes.

Por fim, ainda em relação aos tributos, deve-se salientar que a Constituição Federal arrolou os “direitos fundamentais do contribuinte”, denominado por alguns autores de “estatuto do contribuinte”, os quais devem ser respeitados quando da tributação pela União, Estados, Municípios e Distrito Federal. Estas garantias podem ser encontradas, de maneira concentrada, no artigo 150 da Carta Magna.

3. OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

Trata-se de obrigação que, como já fora dito, decorre de expressa previsão legal e, por esse motivo, é dita ex lege.

Na autorizada doutrina de Hugo de Brito Machado, verificamos que obrigação tributária é “relação jurídica em virtude da qual o particular (sujeito passivo) tem o dever de prestar dinheiro ao Estado (sujeito ativo), ou de fazer, não fazer ou tolerar algo no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, e o Estado tem o direito de constituir contra o particular um crédito”.

Deste modo, caso a hipótese prevista na lei, denominada hipótese de incidência, venha a ocorrer in concreto (ocorrência do fato imponível), surgirá a obrigação vinculando os sujeitos ativo (credor) e passivo (devedor). Assim, obrigação tributária tem estreita relação com a sujeição ativa e passiva pois se trata de vínculo que, por meio de lei, autoriza o sujeito ativo exigir do sujeito passivo o cumprimento da prestação. O tema “sujeito ativo” e “sujeito passivo” serão estudados no módulo seguinte, junto ao tópico “Regra Matriz de Incidência Tributária”.

3.1. Classificação das Obrigações Tributárias

De acordo com a redação do artigo 113 do Código Tributário Nacional, as obrigações tributárias se dividem em dois grupos:

Principal: é a obrigação de pagar o tributo ou multa (penalidade pecuniária), dever de entrega do montante exigido pelo sujeito ativo.

Acessória: é obrigação secundária, diversa da obrigação de pagar tributo. Trata-se de obrigação de fazer, não fazer ou tolerar que se faça algo no interesse da fiscalização ou arrecadação dos tributos, é dever instrumental ou formal. É exemplo de obrigação de fazer a escrituração de livro de comércio, preenchimento de guias e outros.

Finalmente, faz-se importante frisar que há diferença entre obrigação tributária e crédito tributário pois, enquanto a primeira relaciona-se com a própria origem, surgimento, do tributo (realização do fato previsto na lei como gerador do direito de cobrança pelo fisco e conseqüente dever de pagamento pelo contribuinte), o crédito tributário trata-se da apuração do montante, efetuada por meio do lançamento, assunto a ser verificado em módulo posterior.

3.2. Origem da Obrigação Tributária

O mundo em que vivemos é conhecido como o mundo fenomênico, isto é, mundo dos fenômenos naturais.

Com efeito, há fenômenos que não interessam ao legislador e outros cuja ocorrência é prevista em lei, devido à sua importância e repercussão no mundo jurídico. O legislador enumera fatos lícitos e ilícitos no intuito de regular as relações entre os indivíduos e entre estes e o Estado.

No campo do Direito Tributário há previsão genérica, em lei, de fatos que, ocorridos, geram ao sujeito ativo o direito de cobrar o tributo e ao sujeito passivo a obrigação (dever) de prestar seu pagamento. Desse modo, ocorridos os fatos, “nascerá” a obrigação tributária.

Com efeito, a obrigação tributária origina-se quando verificado, no mundo em que vivemos, o fato lícito e não voluntário descrito na hipótese de incidência da norma jurídica tributária. Assim, a origem da obrigação coincide com a origem do tributo, isto é, trata-se da ocorrência do fato que confere ao fisco o direito de cobrar o tributo do contribuinte, restando, a este, o dever de pagamento.

Diz-se que a obrigação tributária é obrigação legal (ex lege) e não voluntária (ex voluntate), pois decorre invariavelmente da lei, sendo impossível derrogar qualquer dispositivo previsto pela simples vontade das partes.

No ordenamento jurídico pátrio vigora o princípio da legalidade estrita em matéria tributária. Assim, a norma tributária só pode ser veiculada por meio de lei.

Ainda, além da exigência de que haja lei instituindo o tributo (artigos 150, inciso I, da Constituição Federal, e 97, inciso I, do Código Tributário Nacional), há exigência mais específica: é necessário que haja competência do ente tributante para que seja válida sua criação. No tocante a essa verificação, deve-se utilizar o diploma constitucional que, nos artigos 153 a 156, traça as competências em matéria tributária.

Assim, caso haja uma lei federal e outra estadual dispondo sobre o mesmo tributo, é necessária a verificação dos artigos supramencionados, para constatar qual das leis deve prevalecer, uma vez que não há hierarquia entre leis tributárias federais, estaduais, distritais e municipais: há apenas divisão constitucional de competência, pois cada uma delas possui campo próprio de atuação.

Ressalte-se que, em decorrência das disposições constitucionais sobre as normas de Direito Tributário, é dito que a “Constituição Federal é a carta das competências tributárias”. Além das exigências relativas à competência para edição da lei é de se salientar que a norma jurídica tributária deve estar completa, isto é, deve prever expressamente os seguintes elementos essenciais:

sujeito ativo;

sujeito passivo;

hipótese de incidência;

base de cálculo; e

alíquota.

À somatória de todos esses elementos, é conferida a denominação de Regra Matriz de Incidência Tributária e, na falta de qualquer um deles, haverá a obrigatória inexistência do tributo (e conseqüente impossibilidade de sua cobrança). Portanto, enquanto a lacuna não for suprida, não existe tributo em abstrato, não podendo existir validamente em concreto, vale dizer, no mundo fenomênico.

Questão interessante foi levantada em razão da edição da Emenda Constitucional n. 32, a qual modificou a redação do parágrafo 2.º do artigo 62 da Constituição Federal, permitindo a criação e majoração de tributos por meio de Medida Provisória, conforme se colhe da interpretação a contrario sensu do referido parágrafo, reproduzido a seguir, in verbis: “ § 2.°. Medida provisória que implique a instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.”

Em que pese à previsão expressa, grande parte da doutrina entende pela impossibilidade do uso de medida provisória para esses fins, pois, segundo estes, a medida provisória tem caráter precário e não corresponde à certeza de que deve se revestir o tributo.

4. SUJEITOS DA RELAÇÃO TRIBUTÁRIA

Na autorizada doutrina de Hugo de Brito Machado, verificamos que obrigação tributária é “relação jurídica em virtude da qual o particular (sujeito passivo) tem o dever de prestar dinheiro ao Estado (sujeito ativo), ou de fazer, não fazer ou tolerar algo no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, e o Estado tem o direito de constituir contra o particular um crédito”.

Engloba, a obrigação tributária, os sujeitos ativo e passivo, fato gerador realizado e responsabilidade tributária.

De maneira extremamente simplista, pode-se afirmar que é relação jurídica e, por este motivo, é dotada de sujeito ativo e passivo.

Finalmente, salientamos que a obrigação tributária pode ser classificada em principal e acessória. Principal é a obrigação de pagar o tributo ou multa (penalidade pecuniária). Por seu turno, acessória é obrigação secundária, diversa da obrigação de pagar tributo, é obrigação de fazer, não fazer ou tolerar que se faça algo no interesse da fiscalização ou arrecadação dos tributos. É exemplo de obrigação de fazer a escrituração de livro de comércio, preenchimento de guias e outros.

4.1. Sujeito Ativo

Sujeito ativo é credor do tributo, isto é, aquele que tem o direito subjetivo de exigir a prestação pecuniária. Este detém a capacidade tributária ativa, de acordo com o que determina o artigo 119 do Código Tributário Nacional.

O pólo ativo da obrigação tributária é normalmente ocupado pela pessoa política que criou o tributo em abstrato, dotada de Poder Legislativo, a qual possui competência tributária

Com efeito, competência tributária é a capacidade atribuída pela Constituição Federal a determinados entes políticos, para criar tributos in abstrato, por meio de lei. Trata-se de competência indelegável, pois é atribuição política concedida pela Constituição Federal e, sendo assim, “não se pode delegar aquilo que foi recebido por delegação” (delegatur delegare non potest).

Capacidade tributária ativa não tem o mesmo significado de competência tributária, pois, enquanto aquela é restrita à possibilidade de exigir a prestação pecuniária, esta abrange a criação e cobrança do tributo.

Geralmente, o ente político que cria o tributo também o arrecada, exercendo a competência tributária em sua plenitude. Entretanto, pode o ente delegar, por meio de lei, a capacidade tributária, desde que a lei seja editada pela pessoa política tributante (aquela que criou o tributo).

Assim, nada impede que uma terceira pessoa venha a arrecadar o tributo. A esta prática é conferida a denominação de parafiscalidade.

Parafiscalidade é a delegação de capacidade tributária ativa que a pessoa política, por meio de lei, faz à terceira pessoa. Só pode se voltar em favor de pessoas jurídicas de direito público (exemplo: autarquias) e de pessoas jurídicas de direito privado perseguidoras de finalidade pública (entes paraestatais, isto é, entes que caminham paralelamente ao Estado, como, por exemplo, sindicatos, SESI, SESC, SENAI, SENAC), não podendo alcançar pessoas jurídicas de direito privado que explorem atividade econômica e, com muito mais razão, não podem alcançar empresas privadas, em decorrência dos seguintes princípios:

princípio da igualdade: as pessoas que se encontram na mesma situação econômica devem ser tratadas de modo igual;

princípio da destinação pública do dinheiro arrecadado mediante o exercício da tributação: esse instituto decorre do princípio republicano, segundo o qual os tributos existem para custear a coisa pública e não a nobreza.

Ainda, deve-se salientar que o valor arrecadado pode ser destinado à própria pessoa jurídica ou ao ente que a instituiu, a depender da determinação constante da lei instituidora.

4.2. Sujeito Passivo

Sujeito passivo da obrigação tributária é a pessoa que tem o dever jurídico de efetuar o pagamento do tributo. Trata-se de devedor do tributo, que pode ser pessoa física ou jurídica, privada ou pública.

Em tese, qualquer pessoa tem capacidade tributária passiva, inclusive as pessoas políticas (União, Estados, Municípios e Distrito Federal). Essas, entretanto, são imunes quanto aos impostos (artigo 150, inciso VI, alínea “a”, da Constituição Federal), mas não o são no tocante às taxas e contribuições de melhoria.

Podemos citar alguns exemplos:

* autarquias: têm capacidade tributária passiva e são imunes apenas aos impostos (artigo 150, § 2.º, da Constituição Federal).

* empresas públicas e sociedades de economia mista: possuem capacidade tributária passiva plena; recebem o mesmo tratamento dedicado às empresas privadas (impostos, taxas e contribuições – artigo 173, inciso II, da Constituição Federal).

* empresas privadas e empresas particulares: têm capacidade tributária passiva plena.

De acordo com expressa previsão legal (artigo 121, §1.º, incisos I e II do Código Tributário Nacional), tem-se que o sujeito passivo da relação tributária pode ser denominado contribuinte, quando tiver relação pessoal e direta com o fato gerador do tributo ou responsável, quando não tiver relação direta e pessoal com o fato gerador do tributo, mas a obrigação de saldar o débito decorre de expressa determinação legal.

Ainda, a obrigação tributária pode ser principal e acessória, podendo ela ser cindida, não sendo requisito de existência da obrigação acessória que a obrigação principal ainda exista. A título de exemplo, tem-se o caso de contribuinte que paga o tributo (obrigação principal) e continua com a obrigação de manter livros devidamente escriturados, emitir notas, permitir que fiscal faça verificações em seu estabelecimento (obrigação acessória).

5. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA

Por hipótese de incidência entende-se a descrição feita pela lei, de um fato que, se ocorrido no mundo dos fenômenos naturais, dará origem a uma obrigação tributária.

Na doutrina de Hugo de Brito Machado, verifica-se que hipótese de incidência é “situação considerada necessária e suficiente para o surgimento da obrigação tributária”; é “hipótese em que um tributo é devido”.

Segundo definição do eminente doutrinador Geraldo Ataliba: “Hipótese de incidência é fato descrito em lei que, se e quando acontecido, faz nascer para alguém o dever de pagar um dado tributo”.

Com efeito, é previsão legal de um fato que, se ocorrido, originará uma obrigação tributária. Pode-se afirmar que a hipótese de incidência guarda semelhança com o tipo penal, pois este também é descrição legal de um fato que, se praticado, fará surgir possibilidade de imputação de sanção penal.

Assim, a título de exemplo, temos que a hipótese de incidência do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, de acordo com o artigo 43 do Código Tributário Nacional, é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de provento de qualquer natureza.

Abaixo, verificaremos que hipótese de incidência é um fato in abstracto, enquanto o fato imponível (fato gerador) trata-se de sua realização in concreto.

Finalmente, salientamos que, de acordo com a unanimidade dos autores, e de acordo com o artigo 4º do Código Tributário Nacional, cabe à hipótese de incidência distinguir um tributo do outro, o que não deve ser feito com base na denominação que este tributo recebe.

6. FATO IMPONÍVEL

A hipótese de incidência difere do fato imponível, uma vez que este caracteriza-se pelo acontecimento daquela (fato que realiza o tipo tributário), e a hipótese de incidência é o próprio “tipo tributário”.

Assim, pode-se concluir que a hipótese de incidência é algo “hipotético” (previsto pela lei), enquanto o fato gerador é sua ocorrência, sua concretização.

Se nos espelharmos no Direito Penal, podemos afirmar que o fato imponível equivale ao fato típico realizado. Portanto, temos que a hipótese de incidência está para o tipo penal (descrição legal do delito) assim como o fato imponível está para o fato típico (conduta do indivíduo).

Costumeiramente, a doutrina confere a denominação “fato gerador” tanto à hipótese de incidência quanto ao fato imponível. Entretanto, em ciência, as expressões devem ser unívocas e não equívocas, portanto, tal denominação não é conveniente, devendo ser melhor especificada.

A expressão “fato gerador” é equívoca, visto que pode proporcionar uma série de interpretações, e, por isso, deve ser evitada. A doutrina clássica faz a cisão da expressão fato gerador da seguinte forma:

Fato gerador in abstracto: tem relação com a previsão legal do fato que, ocorrido, gera direito subjetivo para o fisco proceder na cobrança do tributo. Assim, é de se concluir que tal expressão faz referência à hipótese de incidência, segundo a doutrina moderna.

Fato gerador in concreto: expressão que designa a ocorrência, no campo concreto, do fato previsto pela lei tributária como passível de dar origem a um tributo. Faz referência ao fato imponível, de acordo com a classificação dada pela doutrina mais atual.

Para que haja o surgimento (nascimento) do tributo, necessário que o o fato se ajuste rigorosamente à hipótese de incidência tributária. Trata-se do fenômeno denominado “subsunção”, o qual se assemelha à tipicidade penal ou adequação típica, que se verifica na esfera criminal

O fenômeno da subsunção, traduzido pela necessidade de adequação completa, pode ser verificada em célebre frase de Henzel Albert, segundo o qual: “Só deves pagar tributo se realizas, em todos os seus aspectos, a hipótese de incidência tributária”.

A lei faz a previsão de um fato que, se ocorrido, nascida estará a obrigação tributária, ou seja, descreve a hipótese de incidência e, com a ocorrência do fato previsto, qual seja, o fato imponível (fato gerador in concreto), o tributo será devido.

7. BASE DE CÁLCULO E ALÍQUOTA

Base de cálculo e alíquota são, conforme verificado anteriormente, elementos essenciais da regra matriz de incidência tributária. Esses elementos se prestam a quantificá-lo, isto é, a verificar o quantum debeatur (quantia devida ao fisco), bem como o contribuinte pode constatar o valor a ser pago, a título de tributo, ao sujeito ativo.

Com efeito, a conjunção destes institutos, proporciona verificação quantitativa dos valores, tanto ao Fisco quanto ao contribuinte.

7.1. Base de Cálculo

É a dimensão legal da materialidade do tributo. Para Geraldo Ataliba “é a perspectiva dimensível do aspecto material da hipótese de incidência tributária”.

É o valor sobre a qual será feito o cálculo do montante do tributo. Sobre ela incidirá a alíquota para que seja apurado o valor devido. A base de cálculo deve, invariavelmente, guardar correlação lógica com a hipótese de incidência do tributo, pois enquanto a hipótese de incidência determina o fato abstrato que, ocorrendo, possibilitará cobrança do tributo, a base de cálculo determina, com base no fato previsto, a dimensão sobre a qual incidirá a alíquota do tributo. A título de exemplo, verificamos que no Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, a hipótese de incidência é obter rendimentos e a base de cálculo é a renda líquida; já no ICMS, a hipótese de incidência é vender mercadorias, a base de cálculo é o valor da mercadoria.

Quanto à afirmação de que a hipótese de incidência e a base de cálculo devem guardar correlação lógica, temos que a existência de qualquer incongruência, ou falta de correlação lógica, torna o tributo indevido e não exigível. Podemos citar, como exemplo, o caso do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, do qual a hipótese de incidência é “ser proprietário de imóvel urbano” e sua base de cálculo é, usualmente, o valor venal do imóvel. Sendo assim, não é possível fixar como base de cálculo os rendimentos obtidos a partir da utilização do imóvel, como, por exemplo, o valor dos aluguéis. Caso a base de cálculo fosse esta última (valor dos aluguéis) teríamos incongruência entre hipótese de incidência e base de cálculo, como o que ocorreu em Porto Alegre, capital do Estado do Rio Grande do Sul, na década de 60, quando fora adotado, como base de cálculo para o Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU), o valor dos aluguéis. Diante desse descompasso entre base de cálculo e hipótese de incidência, deve-se entender pela ilegalidade da cobrança feita pelo fisco.

7.2. Alíquota

É, também, elemento essencial e encontra-se apontado na lei que institui o tributo, Normalmente encontra-se expresso em porcentagem e, como acima mencionado, conjugado à base de cálculo, permite que se verifique o quantum debeatur, quantia devida.

A alíquota do tributo exprime, normalmente, o percentual da base de cálculo que será entregue, pelo sujeito passivo, ao sujeito ativo, a título de pagamento de tributo, isto é, expressará o valor devido ao fisco. Como exemplo, imaginemos o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, cuja base de cálculo será o valor venal do imóvel e a alíquota 2%. Assim, o proprietário de imóvel cujo valor venal é R$ 100.000,00 (cem mil reais) deverá recolher aos cofres públicos R$ 2.000,00 (dois mil reais) como valor daquele imposto.A alíquota do tributo deve ser razoável para que não cause diminuição patrimonial excessiva ao contribuinte, pois há vedação constitucional expressa a esta prática, denominada de confisco, nos termos do inciso IV, do artigo 150 da Constituição Federal. Ainda, de acordo com a doutrina de Ricardo Cunha Chimenti, configura-se confisco quando o valor cobrado inviabiliza o exercício de atividade lícita.

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